Um maratonista brasileiro corre para superar obstáculos e os seus próprios limites. Corre por esporte. Corre pelo gosto de trazer uma medalha de ouro pendurada no pescoço. Corre pelo orgulho de ser patriota. Corre pelo orgulho que a família traz em seu seio.
Um trabalhador de uma grande cidade, uma metrópole como São Paulo, com seus braços e pernas engarrafadas e as artérias entupidas até às bocas, corre para atropelar os ponteiros do relógio, que batem fortes e impacientes. Corre para ser mais rápido que a bala de um revólver, que do outro lado da cidade ou do país, atinge um inocente ou simplesmente um viciado em crack. Corre para não deixar as suas demais bocas secas. Corre para a sua família não ouvir os cantos dos parasitas sugando-lhes as energias, a vida.
No sertão, nossos irmãos abandonados correm para não servirem de espantalhos para os grandes donos de postos de gasolinas ou de fazendas. No sertão, nossos irmãos marginalizados correm para não servirem de comida aos urubus, que competem com as moscas para saberem quem é o dono do ar, já que no chão alaranjado não há frutas e nem sinal de sementes de esperanças. No sertão, nossos irmãos desamparados sofrem com as leis, que ainda são as do Coronelismo e as do jagunço, do lampião. No entanto, agora, não se usam cavalos e garruchas de calibre 38, mas sim, automóveis e metralhadoras automáticas. No sertão, os homens acompanham, seguem e são massacrados pela modernização. Somente as leis continuam paradas nas linhas mortas e silenciosas de um livro amarelado, empoeirado e coberto de traças. Traças cabeludas, carecas, com bigodes ou sem bigodes. Há traças para todos os tipos de livros e leis.
Ainda assim, há pelo menos dois motivos que faz todo brasileiro correr com um sorriso estampado no rosto, de orelha a orelha e sem medo nenhum rastreando e vagando pelo corpo: o carnaval (rico em hormônios e feromônios) e o futebol (a paixão nacional!). Dá-lhe o Rio de Janeiro! Dá-lhe a Bahia! Dá-lhe a CBF! Dá-lhe o Pelé!
Somente assim, o povo corre contente, sorridoente, mesmo que seja para daqui a nove meses correr para lotar os hospitais até o teto, ou para nadar e morrer na praia, em um país qualquer, numa competição qualquer, numa copa qualquer, e não voltar nem com uma medalha de ouro no peito.
Dá-lhe o Brasil! Dá-lhe o brasileiro!
Samba, Brasil, que o samba é doce.
(Adams Alpes, 24 de julho de 2009)

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