Gripe causa status quo

Por Unknown | 7/21/2009 04:42:00 AM em , , |

Michael Jackson era um visionário. Custo a acreditar que, um homem que ditou modas e regras a todas as culturas distribuídas nesse planeta, tenha partido da forma como partiu: dessa para melhor, sem dar seu último grito, seu último rodopio, sem se despedir. Certo estava Michael. Eu não olharia para trás, para um mundo onde todos o crucificaram, em vez de abraçá-lo, como sempre clamou: como uma criança desprotegida, diante da boca de um leão, este último, transformando seus sonhos em pesadelos. Antes mesmo da gripe suína estrear nas telonas de todo o mundo, o guru da música pop já lançava moda com as suas “máscaras”. Atualmente, a gripe suína, para compensar a morte do astro-rei, faz com que as pessoas queiram utilizar, a cada dia que passa, mais e mais, esse acessório michaeljacksoniano e, a cada hora que finda, aumentam os adeptos da moda da “máscara”.
Há pouco, li nos jornais, que os hospitais no Rio de Janeiro e em São Paulo estão em uma situação em que salta gente pelas janelas para ser atendida. Tudo culpa da mídia. O mais engraçado é que o povo brasileiro fisga direitinho a isca e aglomera-se, metro por metro, nos corredores dos hospitais, transformando a saúde pública num caos. Mas, é exatamente isso que a mídia quer. Portanto, ter gripe suína no país do carnaval, é ter status. É entrar para o hall da fama das pessoas que pegaram uma epidemia mundial que entrou pelas portas da frente do país: com os turistas que, diariamente, entram e saem dos aeroportos do nosso país, com ou sem aquela afeição de bonzinhos, carentes e deslumbrados com tanta beleza (principalmente das mulheres), e que somente conhecem o carnaval, Pelé e, agora, o Ronaldo. No país do futebol, que pessoa não quer se gabar para os amigos e para a família, que esteve internado por causa de uma doença que pegou de um turista mexicano, espanhol ou norte-americano?
O fato mais cômico, e que chama mais a atenção, é que se fosse o dia nacional de doação de sangue, de doação de órgãos ou de doação de agasalho, com toda a certeza, e arranco meus ouvidos se eu estiver errado, os hospitais não estariam lotados de pessoas até à tampa, pulando pelas janelas, implorando para os médicos um minuto de atenção. Os bancos de sangue não estariam vivenciando um caos e a mídia, muito menos, divulgaria tal ação. Fato curioso: alguém já reparou que os médicos que realizam os atendimentos aos suspeitos da gripe suína não são adeptos aos acessórios da moda, como as máscaras, as luvas etc.? Muito menos os vejo usufruindo o banheiro e lavando as mãos a cada atendimento feito. É! A gripe suína é o caminho mais curto para se tornar emergente ou socialite. Um dia desses, meu pai, para conseguir uma meia-dúzia de gatos pingados para doar sangue no hospital público, teve que gastar a língua tentando convencer os amigos que um dia poderia ser um deles no lugar de quem precisa. Ainda assim, não conseguiu o impacto que queria. Também, meu pai não é nenhum “âncora” de um noticiário sensacionalista em uma dessas emissoras nacionais de televisão. Além disso, muitos ainda são os pré-conceitos nessa hora, como por exemplo, o medo de pegar doenças, entre outros. Engraçado: na hora de pegar a gripe suína, dentro de um hospital público, ninguém treme na base como vara verde, mas, há nora de doar sangue, o hospital causa uma vertigem, não é? É porque doar sangue não traz status quo a ninguém. Imagine-se em uma roda de amigos: se disser que doou sangue, ninguém aplaude. Ninguém assobia. Ninguém vibra. No entanto, se disser que esteve de cama durante alguns dias, por causa da gripe suína, todos irão te vangloriar, te encher de perguntas e fazer um busto para condecorá-lo. Na ocasião, torna-se até herói da cidade. O povo brasileiro é o que mais tem o rabo dos olhos virado para o próprio umbigo e não se importa com o dia de amanhã. Além disso, é um povo extremamente acomodado. Ainda mais depois que o Obama teve a coragem de dizer que nosso querido presidente Lula é o “cara”. Obama!, venha para o Brasil, meu querido. Venha viver alguns meses aqui. Encontre um barraco na Rocinha ou na Cracolândia, ou ainda, quem sabe, nas grandes cidades cosmopolitas, como as capitais de São Paulo e do Rio de Janeiro. Você verá como é gostoso desejar ter gripe suína para aparecer no jornal, para ter fama e sucesso por quinze minutos. Você verá como a mídia manda e desmanda em um povo fraco e carente de uma nação forte, firme e com seus heróis, como super-homem. Você verá como é fazer parte de um povo sem identidade e que tem apenas um grito às margens plácidas do Ipiranga e, mesmo assim, falso e pintado à francesa. Um povo carente de heróis, pois não tem a menor ideia e não sabem quem são os verdadeiros heróis de nossa aquarela.
Ainda por cima, para complicar a minha crônica, moro em uma cidade onde tudo, exatamente tudo, “pula” nosso pequeno território. A chuva pula, o calor pula, o circo, os parques, até a gripe suína pula essa cidade. Sorte minha e azar dos meus colegas, já que não vão aparecer nos jornais, nem mesmo locais, sendo vítimas da gripe que fornece status quo social.


(Adams Alpes, 21 de julho de 2009).

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