Utopia: “tem como significado mais comum a ideia de civilização ideal, imaginária, fantástica. Pode
referir-se a uma cidade ou a um mundo, sendo possível tanto no futuro, quanto
no presente, porém em um paralelo. A palavra foi criada a partir dos
radicais gregos οὐ,
"não" e τόπος, "lugar", portanto, o "não-lugar"
ou "lugar que não existe". ( Wikipedia)
Cidania Cultural: “Segundo Bastos (2002:134), assinalou se por um
lado a Constituição Federal trouxe um aporte significativo de leis que
alcançaram um escopo fundamental de variáveis para a construção da cidadania
cultural, por outro, tornou-se necessário um engajamento da sociedade
organizada como forma dar sentido a essa nova ordem jurídica. Corroborando com
esta ideia Soares (2001 )afirma que a promoção da acessibilidade aos bens
culturais, enfatizando que ela cumpre as determinações da constituição Federal
de 1988, quando consagra os direitos das portadoras de deficiência física e
também proclama o direito a cultura, em seu artigo 215,seção II, da cultura:. O
Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às
fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão
das manifestações culturais.”
“Patrimônio cultural é o
conjunto de todos os bens, materiais ou imateriais, que, pelo
seu valor próprio, devem ser considerados de interesse relevante para
a permanência e a identidade da cultura de um povo.
O
patrimônio é a nossa herança do passado, com que vivemos hoje, e que passamos
às gerações vindouras.” Wikipédia
Segundo dicionários e iminentes
filósofos, cidadania cultural é o direito de qualquer cidadão não apenas ao
acesso à cultura como à sua produção e difusão. Entretanto, todos os textos aos
quais tivemos acesso não tratavam da produção, do fazer a Arte. Ocupavam-se das
teorias políticas, em especial as que rechaçam o neo liberalismo e privilegiam
o que chamaremos, á falta de maior conhecimento teórico, de filosofia de
esquerda. Nesses textos ( todos muito bons, incluindo a leitura de Marilena
Chauí ), fala-se muito mais da necessidade do acesso á população aos bens
culturais do que sobre sua produção, propriamente dita.
Os bens culturais no nosso país estão sendo respeitados de
acordo com a própria visão de bem cultural- plenamente acessível a todos,
protegido, veiculado e mantido pela sociedade? Pensamos que esta questão está
sendo silenciada pelos próprios interesses que cercam os valores desses mesmos
bens culturais.
O bem cultural não é
monopólio de um partido, de um governo (se pudéssemos colocá-lo num extremo
provável) tampouco é um bem passível de uso para promover interesses
particulares que não deixam que este produto seja socialmente desfrutado, ou
dividido, ou mesmo exposto.Nenhum desses extremos é positivo, nem mesmo condiz
com o que consta no artigo 215, seção II da nossa Constituição. Na perspectiva
desses extremos que mencionamos, a chamada Cidadania Cultural nada mais é do
que pura Utopia, ou seja, um não lugar. Um conceito apenas sonhado, irrealizado.
Nosso país é rico em cultura até porque
a formação do Brasileiro é multicultural. Temos influências diversas desde as
três etnias que se encontraram no descobrimento do país até as diversas etnias
que se instalaram no Brasil ao longo do tempo (ariana, asiática, islâmica,
semita, só para citar alguns exemplos). O Brasil, portanto é rico em
manifestações culturais diversas ( e isso não é utopia), mas a cultura que o
povo cria com sua peculiaridade anda se prestando ao uso mercantilizado,
devorando, mastigando e triturando
manifestações culturais autênticas para vomitá-las no mercado em uma pasta
massificadora e alienante, sem preocupação outra que não o consumo rápido. Em
vez de cidadania cultural, temos então a voracidade do capitalismo desenfreado,
interessado em venda/consumo e que serve aos interesses de uma política cada
vez mais corrupta e esta, por sua vez, serve e se serve de uma “fast
food cultural”.
Onde o artista nessa
situação? Qual o seu lugar?
É nossa opinião que os bens
culturais não são propriedade ou massa de manobra para politicagem. Não é um
purismo que propomos, é uma garantia da
legitimidade e autonomia não apenas da cultura mas de seu produtor – a
manifestação (autoria) popular, advinda de qualquer classe social . Vincular os
bens culturais com a corrupção política e o mercantilismo gera o monopólio do que não poderia ser
monopolizado: a livre circulação do obra e seu artista, compromissado com sua
arte, sua visão de si mesmo e do mundo que o cerca. Nem a Arte, nem o Fazer
Cultural nem o Artista devem ser ferramentas de uma classe que tudo faz para
tornar-se absoluta e perpetuar-se no poder.
Essa situação extingue a possibilidade da diversidade cultural,
silenciando o legítimo criador e sua criatividade, bem como a sua liberdade em
usar sua voz, sons, palavras, cores e linhas, massas, corpo, intuições e
emoções, de forma autêntica, sem manipulações, sem a preocupação de produzir
obras que agradem ao seleto grupo daqueles que, por dever constitucional, deveriam
difundir a Cultura/Arte de forma democrática. A corrupção e o mercantilismo
(que hoje se apresenta no pomposo termo inglês “ marketing” ) sempre compromete
a alteridade, em qualquer âmbito. Isso porque o supra mencionado poder se
comporta como o reizinho mandão da fábula e está pronto para silenciar o
discordante, naquilo em que sua produção difira de seus pontos programáticos ou
mesmo quando deseja privilegiar seus escolhidos que obviamente estão conformes
à uma visão particularista. A censura, agora, se apresenta de forma insidiosa e
sutil, disfarçada em “critérios de
avaliação”, mas é o mesmo silêncio imposto pelas ditaduras. E pelos mesmos
motivos: capital, controle, poder.
Não podemos, porém,
incorrer em outro extremo, ou seja, deixar a produção cultural nas mãos do
mercado e apenas para esse fim. Isso também escraviza o artista, artesão,
produtor cultural, que se vê nas mãos impiedosas do consumismo alienado que
torna a arte/fazer cultural tão somente mercadoria, alienada do princípio de
que essa produção emerge da intuição profunda -como nos diz Ferreira
Gullar- seja do artista popular ou do
erudito, por conta de uma necessidade interior, uma necessidade que busca a
expressão em obras e na matéria e nos sons, ou no corpo para corporificar essa
emoção, por vezes frágil e fugaz, quando não é um insight de uma manifestação do sublime.
Pensamos que as obras
culturais dizem respeito a um contexto espaço-temporal, nem que essa obra
represente uma antítese a esse contexto. O seu criador as produz para
sobreviver ao seu tempo. Um artista, na acepção do termo, deixa marcas e
mensagens, mesmo que afirme não ser esta sua pretensão. A prática (
infelizmente comum) de cercear a produção cultural pela invisível censura do
privilégio político, vai esmagando a cultura e seu fazer ou seja, a arte em
qualquer das suas manifestações. A
realidade é que as leis de incentivo cultural não estão ao acesso de todos,
o que manda por ralo abaixo o projeto de Cidadania Cultural e nos fazem pensar
que tal é, na melhor das hipóteses, uma Utopia. Na pior... bem, uma ação
política que nada mas é do que “Panis et Circenses” – Pão e Circo. No caso, a
cultura vira o circo, no mau sentido.
Os bens culturais não dão
em árvores, embora o artista contemporâneo possa usar maçãs para sua obra de
instalação. Mas todos os artistas precisam
( ou deveriam) ter maçãs para se alimentar...
Os bens culturais estão
imbricados no fazer-se constante e
contínuo. O artista, o criador, de uma maneira ou outra deveria ser protegido,
ou deveria ter condições de se proteger contra a maré extremamente corporativista.
É natural a condição de competição em nossa sociedade capitalista, porém
o corporativismo não suporta a manifestação daquele que quer dispor de seu
talento e sua expressão fora da ditadura que serve a interesses comerciais e/ou
políticos. E por esse e tanto outros que não se curvam ao jogo de interesses,
permanecem à margem dos circuitos
culturais oficiais.
Nessa marginalização, há um
dado positivo que é a liberdade. Embora seja parcial, alguma liberdade é melhor
que nenhuma. Porém precisamos ampliar a maneira de veiculação dos bens
culturais através de uma valorização intensiva de inserção, ou reinserção, do
artista e sua obra na sociedade, fazendo com que o artista seja valorizado pela
sua produção e talento, tornando-se alguém que possa a desenvolver sua visão de
mundo e da sociedade em que vive e trabalha.
Leis como a lei Rouanet,
ainda não são plenamente acessíveis. Infelizmente, há uma minoria privilegiada
( e nem sempre pelo talento) que
está abocanhando as verbas governamentais, como é o caso, de forma injusta.
Talvez
digam, nosso pensamento, sim, seja utópico. Contudo, a proposta de Cidadania
Cultural não foi nossa. Aliás, com ela concordamos plenamente. Desde que seja
aplicada realmente e não se preste a palanques e comícios.
10/12/2012
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