É necessário, antes de tudo, a definição de poesia contemporânea. O que se chama aqui de contemporânea é, sobretudo, aquela feita após a terceira fase do modernismo (1945) até os dias de hoje. A poesia é arte e a função da arte é questionar a realidade, fazer refletir e desestabilizar, ou seja tirar-nos de nossa zona de conforto, diferente do entretenimento que acolhe, conforma, faz esquecer o indesejável da vida e do cotidiano. É a expressão da subjetividade por meio da linguagem verbal, ou seja, das palavras e tem o papel de humanizar o ser humano.
A poesia contemporânea é a reação da sensibilidade ao capitalismo de consumo que tira do homem moderno o individualismo, o torna anônimo, parte insignificante de uma grande massa consumidora. Cabe ao poeta dar ao homem comum a importância de ser único, incomparável e excepcional, oferece um novo olhar para a realidade, prega um novo comportamento desse homem, uma nova relação com o seu tempo, com o materialismo exacerbado e marcante em sua vida. A poesia contemporânea nos possibilita sentir, de forma verdadeira, o mundo e não apenas fazer parte dele como uma peça dentro de uma grande engrenagem. Olhar como, pensar como, ser, um outro que não nós, isso nós dá a sensação de completude e, ao mesmo tempo a percepção de sermos únicos e incomuns no mundo. A poesia nos liberta das garras e amarras do real racional e permite a transcendência do nosso corpo individual e físico para um corpo espiritual e coletivo, a poesia é, como diz Adélia Prado, uma manifestação religiosa. É, então, um constante exercício de reaprendizagem de novas possibilidades de ver um mesmo mundo.
Esteticamente, é quase impossível definir a poesia contemporânea porque ela é eclética, se apresenta de diferentes formas, pois o mundo hoje é assim, múltiplo e fragmentado, o homem moderno é, ao mesmo tempo, inúmeros e também um só em inúmeras partes. Mas dentre as várias vertentes da poesia contemporânea é possível estabelecer três principais:
A poesia descritiva: Dá ênfase no cenário objetivo, geralmente urbano, o poeta faz descrições das coisas, das pessoas e dos lugares que o cercam, talvez em uma busca de localização e inserção no mundo. É o tipo de poesia muito comum na internet.
A poesia hermética: Dá voz ao inconsciente, visando dizer aquilo que ninguém sabia que se precisava dizer, isso está nas entrelinhas no texto. É a mais apreciada pelos críticos, uma vez que é mais difícil de entendimento por utilizar metáforas incomuns.
A poesia memorialista: O saudosismo foi um movimento estético da literatura portuguesa no início do século XX, a saudade é considerada um traço marcante da alma portuguesa, talvez por nossa herança esse tipo de poesia é ainda muito prestigiada pelo grande público. O texto resgata o passado de forma nostálgica, mas com um novo olhar sobre ele, renega o presente e o futuro, deixando a sensação de que tudo no passado era melhor.
O que se pode afirmar é que a matéria da poesia contemporânea é o cotidiano, o comum, o ordinário, é a desmistificação dos mitos e a mitificação da experiência pessoal. Há um grande problema na poesia brasileira, é que ela ainda vive em pequenos grupos de amigos, ainda não chegou ao grande público, há poucas, mais do que antes é verdade, mas ainda poucas, discussões e encontros sobre poesia. E as discussões que existem se referem a uma poesia elitista, cheia de citações e referências apenas compreensível a um público seleto, letrado e bem alimentado.
Porém a poesia por seu caráter, edificante e revolucionário, de questionar a realidade tem que chegar às calçadas, às ruas, aos guetos, enfim a todos, sem exceção, por que quando questionamos a nossa realidade racional damos vozes a nossa irracionalidade emocional e inconsciente, que é o que precisamos para entender que o ser humano necessita de algo bem mais caro do que o dinheiro pode comprar.
Fabiano Fernandes Garcez - São Paulo/SP
A poesia contemporânea em debate
Por Anônimo | 5/12/2009 12:12:00 PM em Artigos, Fabiano Fernandes Garcez, São Paulo | comentários (0)
Escondi na ficção
o olhar para que você descobrisse
(...) não, não descobriu.
Coloquei uma trava nos pés,
mas preservei a liberdade nas mãos... tão limitadas.
Desenhei meu destino... tão triste sem você.
Corri atrás das estações que você levou...
a primavera dos meus sonhos,
o outono da minha vida,
O inverno do meu peito...
O verão chegou deixando-me no frio,
Deixando somente a lembrança dos seus olhos
Que eu tanto quis
que tivessem
um pouquinho de ficção...
Cintia Santos - Taubaté/SP
Variações sobre a pedra
Por Anônimo | 5/10/2009 12:26:00 PM em Aparecida, Contos e Micronarrativas, Wilson Gorj | comentários (0)
I. Na profusão de seus pensamentos destacava-se este verso de Drummond: NO MEIO DO CAMINHO HAVIA UMA PEDRA.
– Agora não há mais, respondeu para si mesmo, enquanto lavava suas mãos assassinas.
II. No meio do caminho havia uma pedra. Havia uma pedra no meio do caminho...
“Azar de quem a perdeu”, comentou o jovem drogado antes de fumá-la num cachimbo improvisado.
III. “Uma rosa é uma rosa é uma rosa.”
Gertrude Stein
A professora explicava que o poeta queria dizer que a constante pedra no meio do caminho representava os obstáculos da vida. Mas se dizia isso era porque não era poeta. Se fosse, saberia que uma pedra no meio do caminho não representa outra coisa a não ser uma pedra no meio do caminho.
Uma pedra é uma pedra é uma pedra.
Wilson Gorj - Aparecida/SP
Soneto do amor imperfeito
Por Anônimo | 5/10/2009 12:23:00 PM em Paulo Franco, Poesias, Ribeirão Pires | comentários (0)
Não quero mais buscar o amor perfeito
pra camuflar o sentimento em chama
e amortecer o que me dói no peito,
a mesma dor de todo ser que ama.
Que amar assim, eu sei, não é direito,
pois todo peito preso nesta trama
adoecido faz do olhar um leito
pra adormecer a fonte deste drama.
Vou procurar amar só o instante
um amor maior, porém um passageiro
tão transeunte quanto o amante
que tenha amores pelo mundo inteiro
e ao invés da dor o peito sempre cante
o imperfeito amor que é o verdadeiro.
Paulo Franco - Ribeirão Pires/SP
Roteiro para acompanhar a procissão de soluços
Por Anônimo | 5/10/2009 12:21:00 PM em Poesias, Ribeirão Preto, Whisner Fraga | comentários (0)
Em Minas um boi cacareja a sua desconfiança de canário
Em Minas um pito estremece na boca despetalada do velho
(que nem supõe mais como ou quando morrer)
Em Minas o sol se melindra com a fecundidade esverdeada das coisas
O trem apara a preguiça das serras
(enigmático como tudo se torna trem em Minas)
Um compêndio de curas nas rezas calejadas das mulheres
As tripas das paredes escapando da erosão dos rebocos
(Minas é um povo caducando nas horas desabitadas)
Já é impossível pescar esta Minas em Minas
Libertar esta Minas de Minas
Ou desonrar o ventre que traduziu em desassossego essa rigidez mineral
Um galo esporeia, com sua covardia amolada, os chifres da morte
Enquanto uma rede nina uma selvageria de substratos:
Há um torrão de Minas engastalhado na minha garganta.
Whisner Fraga - Ribeirão Preto/SP
Poema que não diz nada!
Por Anônimo | 5/10/2009 12:20:00 PM em Guaratinguetá, Poesias, Tonho França | comentários (0)
Inventam:
fast food,
Self service,
just in time,
delivery,
loja de conveniências
Mas e dai?
O que eu quero é você:
Agora, ao vivo!
Um beijo e nada mais.
Tonho França - Guaratinguetá/SP
Guardador de friezas
Por Anônimo | 5/10/2009 12:17:00 PM em Adams Alpes, Caçapava, Poesias | comentários (0)
Não vou chutar as pedras minhas
que cruzam o meu caminho.
Vou juntá-las!
Por que as manhãs se há as noites?
As minhas manhãs são inundadas
e úmidas e imundas e mudas.
Sou um Guardador de friezas.
Guardo as pedras e os espinhos e a indiferença.
A Grande diferença é que as uso...
Bem ou mal...
Levanto o meu alicerce
de minha propriedade
com colas em bastão
e cimento e pedras e espinhos.
A indiferença reveste o interior.
Não deixa as pedras expostas.
Ainda assim,
o lar permanece frio.
Adams Alpes - Caçapava/SP
Evito escrever verdades
veleidades
aleivosias
(abismado em águas descobertas
receio o eco inebriado: letra
estrangulada)
reviro mentiras
ao lado desproporcionado
em cantos: calo o verbo.
Levanto bandeiras
em punhais enviesados.
Verdades: a indiferença
anotada no canto da folha
jogada ao chão de outonos.
Pedro Du Bois - Itapema/SC
Crepúsculo de Guaratinguetá
Por Anônimo | 5/10/2009 12:12:00 PM em Eryck Magalhães, Guaratinguetá, Poesias | comentários (0)
Olhos que observam
o gracioso vôo das garças
Não percebem o esforço
O bater fremente das asas
O respirar ofegante
que infla o peito
a gravidade impondo-se
de modo pungente
As penas trepidando
O imenso trajeto a percorrer
Pousar
é
sempre
um
alívio
O chão é o imã absoluto que tudo retém.
Eryck Magalhães - Guaratinguetá/SP
almost blue
Por Anônimo | 5/10/2009 12:06:00 PM em Poesias, São José dos Campos, Valéria Tarelho | comentários (0)
até aqui
deu quase tudo certo
quase perto de
quase lá
quase êxito
hesito
- quase-equilíbrio -
existo
- quase-delito -
insisto
quase que por causa
desse quase risco
Valéria Tarelho – São José dos Campos
Charuto cubano
Por Anônimo | 5/10/2009 11:46:00 AM em Clebber Bianchi, Poesias, Taubaté | comentários (0)
e o canto do pintassilgo emudeceu na gaiola
Minha cachaça perdera o gosto quente
exposta ao sol dos dias
Mesmo uma pimenta aberta no prato
caçoava minha coragem
Senti desconforto
E sob meus pés,
o vácuo das manhãs sem sal provocava saudades
É contínua a direção dos ventos
segundo os sonhos...
seguindo sempre somente e só...
Os apoios que me sustentam
são espinhos tristes, sanções expressionistas
cenários de Van Gogh
Meu peito dilatado
ressalva as atitudes corriqueiras nas janelas
temperadas de línguas
E sobre a rede (...)
... e sobre a rede
Somente um legítimo charuto cubano
fazia-me companhia
e entre um trago e outro
trago saudades
Ao fundo,
...solos de blues
Solos de blues
à tarde
As araucárias choravam suas perdas
e as folhas caíam como eu...
Solitariamente
Clebber Bianchi – Taubaté/SP