Acho mesmo que a vida é recheada de pequenos atos. A mim, cabe escolher a cobertura. Você deve se perguntar agora o porquê de começar essa crônica falando de comida. Pois é, escrever e viver estão ligados ao preparo de um prato, a uma receita. Escrever e viver são receitas, mas, em alguns momentos, as pessoas esquecem ou não aceitam receitas de terceiros e resolvem improvisar suas próprias receitas, chegando a matar, cair em desespero, chorar por coisas que aparecem mascaradas de coisas ruins e que nos enganam com fisionomias toscas e grandiosas, mas que não passam de pequenas coisas, somente pequenas coisas, transitoriedades. Para piorar, algumas dessas pessoas chegam até a achar que pode ser o fim do mundo, que o túnel da boa esperança está sendo fechado por uma enorme pedra que sufoca tudo, deixando tudo negro, tudo apertado, tudo irrevogável.
Eu resolvo todos os meus pequenos atos com outro pequeno ato, tão simples quanto falar um oi em um dia ensolarado ou dizer bom dia para as pessoas que cruzo no caminho ao trabalho. Resolvo uma pequena coisa como, por exemplo, uma conta bancária no vermelho, tomando uma latinha de cerveja. Noutro dia fui ao supermercado e, ao sair, deixei a pizza cair com o recheio para baixo, sendo sugada pelo chão. Na mesma hora, a minha irmã me disse que os recheios são atraídos para o asfalto, pra o chão, para baixo. Fiquei puto da vida, mas também resolvi o problema de forma simples: tomei outra latinha de cerveja. Não deixei uma simples pizza me levar com ela ao chão, me levar para baixo. Isso também tenta acontecer quando meu time perde, mas lá vou eu até a geladeira, pego uma latinha de cerveja e resolvo tudo com alguns pequenos goles desapressados. Até mesmo uma dor de estômago, que me pegou outro dia, deixo boiando no meio de uma latinha de cerveja. E quando menos percebo, lá estão todos os problemas sendo levados pela água, malta e cevada. É, e neste caso, literalmente levados pela água.
Assim, vou pra cama. Durmo e acordo pronto para mais uma maratona de azar, de pequenas coisas me atormentando no ouvido, querendo me assustar e vestindo uma máscara maior do que podem suportar, mas, por uma fração de segundo, lembro que a vida é recheada de pequenas coisas e que não farei dos minutos de sono uma pequena parcela do meu dia, já que, no final, posso escolher a cobertura.
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